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16 de Janeiro de 2024

Adicionámos novos testemunhos

Esta semana publicámos três novos testemunhos. Cada um destes testemunhos é um exemplo de força, coragem e perseverança. É com um imenso orgulho que apresentamos os três nesta publicação. Se desejar ler mais, visite a nossa página dedicada aos testemunhos de homens que procuraram ajuda na Quebrar o Silêncio.

Rafael – 20 anos

Inicialmente, desvalorizava a minha história e achava que havia gente pior do que eu e culpabilizava-me pelo que tinha acontecido. Sentia ansiedade com as pequenas coisas do dia-a-dia e a determinada altura comecei a ser dominado pelo medo e pelas minhas inseguranças. Não tinha vontade de sair de casa e arranjava “desculpas” para não fazer as coisas. Sentia um mal-estar quase constante e tudo me fazia lembrar o que tinha acontecido.

Foi difícil ao início aceitar que tinha que procurar ajuda porque pensava que ao falar com alguém sobre o que me tinha acontecido iria tornar o acontecimento “mais real” e mais presente, para alem de ser mais uma pessoa a saber.

A Quebrar o Silêncio foi muito importante para me ajudar a ultrapassar e a aceitar o que me aconteceu. Ajudou-me a entender que não posso mudar o que me aconteceu, mas posso aprender a lidar com isso da melhor forma possível e assim tornar-me mais forte. Acima de tudo ajudaram-me a entender que não tive culpa nenhuma e que não poderia ter previsto o que aconteceu. Transmitiram-me confiança e tiveram sempre muito respeito por mim, pela minha privacidade e pelo meu tempo.

Por isso, se estiveres a ler isto e estiveres indeciso ou se te faltar a coragem, confia e Quebra o Silêncio, por ti e por todos.

 

Liam – 33 anos

Eu sentia que havia uma pedra no sapato que nunca conseguia tirar. Eu sentia que havia uma ferida que ao menor descuido, se abria e voltava a sangrar. Uma ferida que às vezes não tinha nome, uma dor que precisava silenciar. E se aquilo tudo foi uma imaginação? E se tudo aquilo é minha culpa? Carregar essas emoções, sentimentos e memórias, sem conseguir elaborar direito, sem conseguir falar direito era o que mais me machucava.

Eu conheci a Quebrar o Silêncio em 2018. Em 2019 comecei a fazer terapia para tratar dessa violência e foram quase 4 anos tentando, sem sentir que estava alcançando esse objetivo específico. Atingi muitos outros, mas falar sobre o abuso ainda era um desafio muito grande. Em 2023, eu recebi alta da terapia que estava fazendo e decidi que era o momento de procurar a Quebrar o Silêncio. Eu senti que pela primeira vez eu estava tratando de fato do assunto. E saber que esse atendimento, essa atenção foi feita de forma gratuita, possibilitando o acesso aos diversos perfis, seja qual for a sua realidade social me deixa muito mais feliz. Eu não teria condições financeiras naquele momento de arcar o acesso à ajuda que recebi.

Meu apoio foi realizado pela psicóloga Filipa, ela me ajudou naquilo que eu precisava, elaborar minhas emoções no dia a dia, sempre muito atenciosa e muito disponível. O trabalho da Quebrar o Silêncio é incrível.

Não é fácil você se abrir, mas eu posso dizer que hoje eu me sinto muito mais aliviado. Eu sinto que eu estou vivendo a minha vida de maneira mais leve, com força e confiança para viver o cotidiano, a vida e seus desafios.

Hoje eu tenho 33 anos. Eu demorei 25 anos para tratar diretamente dos abusos sexuais, pois é como se quando você nasce “homem” você não tem o direito de ser uma vítima de abuso sexual. “Aquilo não foi abuso”. Assim você arrasta dor e sofrimento por muitos anos, por vezes negando, sempre silenciando. E essas memórias ficam ali te consumindo. Felizmente, associações como a Quebrar o Silêncio existem. A ajuda é real. Tudo que você viveu é real e você merece viver uma vida melhor.

Hoje eu me sinto muito mais disposto a cuidar de mim e da minha vida, hoje eu me sinto muito mais feliz por ter encontrado em meu caminho a Quebrar o Silêncio e agradeço a cada pessoa que faz parte dessa história.
Muito obrigado.

 

Ricardo – 38 anos

Vivi até os 33 anos de idade a sofrer de ansiedade e fobia social. A ansiedade só aumentava com o passar dos anos e, por isso, resolvi pesquisar o motivo, até que li num site a seguinte manchete: “Homens que sofreram abuso sexual na infância tendem a ser mais ansiosos na vida adulta”. Naquele momento recordei do que me fizeram quando ainda era pequeno.

Eu tinha cerca de 7 anos. Eu e a minha mãe morávamos numa pequena casa alugada, e, enquanto ela trabalha, eu brincava na rua, como qualquer outra criança. Um dos vizinhos, mais velho do que eu, começou a abusar de mim. Não era nada forçado, porém, de alguma forma que eu não me recordo, fui convencido a permitir que os abusos acontecessem. Isso aconteceu durante algum tempo, até que comecei a passar as férias escolares na casa da minha avó paterna. No mesmo período, outros dois primos mais velhos do que eu, também começaram a abusar de mim. Isso aconteceu até aos meus 9 anos, altura em que os abusos pararam.

Entrei na adolescência muito confuso, tímido, não conseguia conversar com ninguém, meu pai não tinha contacto comigo. Somente aos 33 anos consegui entender o que de facto aconteceu, e, confesso que a descoberta foi pior do que o abuso em si. Foi como se uma bomba tivesse explodido e senti-me desorientado, envergonhado, triste.

Até que descobri a Quebrar o Silêncio, que me ajudou, através do acompanhamento psicológico e dos grupos de ajuda mútua, a entender como lidar com isso. Foram cerca de 6 anos até que eu pudesse compreender que a culpa não foi minha. Hoje levo uma vida bem mais leve e sem pressões psicológicas, como se tivesse nascido novamente.